A tarde já está findando e acho melhor darmos uma última sugestão a todos vocês antes do pernoite de nosso primeiro dia!", anunciou o gringo louro, sempre traduzido pelo competente Alberto. "A dica é a seguinte: os que quiserem aproveitar os últimos raios de sol de hoje para pescar, seja nas águas da cachoeira ou ao longo de todo o rio, em seu caminho rumo à Usina e ao Portão, que está limpinho e piscoso como nunca, fiquem à vontade. Agora, uma última coisa por hoje, queridos amigos, vocês já devem ter visto centenas barracas armadas por todo o campo, no pátio defronte a casa do S. Bentico e ao longo do aterro. São barracas suficientes para todas as famílias. Na verdade, à porta de cada uma delas, há uma etiqueta com o nome da família que deverá ocupá-la. Dentro de cada barraca você encontrarão tudo o que necessitam para fazerem fogueiras, prepararem uma deliciosa refeição e ficarem conversando até por volta da meia-noite, em grupos de cinco a seis famílias, quando então deverão se recolher para uma boa noite de descanso. No interior das barracas também há leitos improvisados. Amanhã, sugiro que se levantem entre 6h30 e 7hs, quando a passarada começar a fazer festa para saudar o novo dia que nasce, que preparem também um rápido café comunitário e voltem para aqui perto desta estrutura para receberem novas orientações e prosseguirmos em nosso esforço de restauração deste nosso Vale Encantado! Fiquem à vontade para conversar bastante ao redor das fogueiras e para caminhar pelas ruas de nosso Vale Encantado. Mas, só façam isso se tiverem boas lanternas. Hoje a Lua estará em quarto-minguante e ainda não recolocamos todas as lâmpadas nos postes de nossa Vila. Isso, por outro lado, permitirá que um maravilhoso “lençol” de trilhões de estrelas esteja perfeitamente visível sobre vocês, num espetáculo que jamais será esquecido! Agora vão... Eu e Mr. Alberto também precisamos descansar. Também estaremos nos recolhendo por algumas horas com nossas respectivas famílias”. E aqui, Mr. Smith dispensou a ajuda do Pagan e ele mesmo se despediu no melhor “português” que conseguiu: “Boa noitchi a todos! Hasta amanhãna!”.
E assim se fez... Aos poucos, podia se ver fogueiras sendo acesas diante de grupos de barracas, nos lugares indicados por Mr. Smith, ao longo de toda a Vila. A noite caía linda e era indisfarçavel a excitação e contentamento daquela gente amiga novamente reunida sob a liderança daquele senhor estrangeiro surgido do nada. Alguns tinham seguido sua recomendação à risca e procurado as margens do rio na estradinha da Escola até a Casa de Pólvora. Outros, subiram com caniços e latas de minhocas até a Cachoeira. Outros, ainda, aventuraram-se em direção ao Largão ou da Pontinha que levava à estradinha da prefeitura. A noite estava quente e a energia por todo o Vale era algo indescritível com aqueles velhos amigos se reencontrando, se lembrando dos locais onde haviam as melhores minhocas - daquelas grandes e espertas que ficavam se mexendo, mesmo no anzol e atraindo tilápias e carás - abrindo caminho no escuro por entre milhares de luzinhas verdes dos pirilampos. Ouvia-se muitas risadas gostosas, ao longe, vindas de todos os lados do Vale. Era uma noite de reencontros, de encantamento, de se sentir no paraíso... Algumas mulheres, preocupadas com seus filhos ainda pequenos, preferiram ficar perto de suas respectivas barracas, próximas às fogueiras. Elas reuniam o que tinham em suas barracas e resolviam preparar uma refeição comunitária, bem ao "velho estilo Light"! Algumas se lembravam de velhas receitas ensinadas por suas mães e avós... Era tudo muito emocionante... Uma sensação de renascer no rosto de cada pessoa... Não raro, lágrimas de felicidade escorriam-lhes pelos rostos..
...Como era de se esperar, ninguém conseguiu "pregar o olho" aquela noite. E como se tivesse sido combinado em todos os acampamentos, a idéia das refeições comunitárias se espalhou como aquele fogo que, de vez em quando, no Verão, quando o capim gordura estava alto e seco, incandescia toda a montanha e iluminava o Vale embaixo. Então, mesmo depois de terem comido até se fartar e alguns já terem colocado os filhos menores para dormir em suas barracas, cada adulto... Homem, mulher... Achou um bom lugar ao redor da fogueira mais próxima e ali ficou olhando o céu, sentindo a brisa da noite roçando em seus rostos... Rindo... Ou chorando... Muitas vezes de alegria, outras, de saudade... De momentos vividos naquele lugar sagrado e que ficara para sempre em suas lembranças e que agora pareciam reviver! De vez em quando um homem chegava de sua pescaria noturna. Uns voltavam sozinhos... Outros, em grupos... Mas, todos - trazendo uma fieira de peixes nas mãos ou não - tinham um sorriso no canto da boca e a mesma expressão de maravilhamento quando seus rostos reluziam perto das fogueiras! Eram recebidos por suas respectivas esposas, irmãs, mães, filhas, com abraços e beijos e logo ganhavam suas generosas porções de comida! Ao longe, no topo da colina onde aquele agrupamento de belas casas da chefia ficava, observando por entre uma das janelas do piso superior as colunas de fumaça subirem sobre as copas das árvores, brotando de todas as direções da Vila, Mr. Smith, também não podia evitar um sorriso silencioso e de profundo contentamento... "What a night!" (Que noite!)..."What a night!", repetia baixinho...
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