Não demorou muito para que uma base fosse arranjada. Era uma espécie de mesa trazida do interior da Casa de Força. Sem muita dificuldade Mr. Smith subiu nela e, uma vez lá em cima, estendeu a mão direita para ajudar o Pagan a subir. Agora todos os homens, até os que se encontravam lá atrás, na última fila, na altura da garagem, viam perfeitamente a silhueta dos dois homens sobre aquela plataforma improvisada. Eles estavam sem microfone mas Pagan tinha o megafone usado nos dias anteriores numa das mãos. Então, após alguns instantes, quando a agitação pelo surgimento dos dois homens estabeleceu-se entre aquele mar de funcionários, agora reinava o mais absoluto silêncio em toda a área quando Mr. Smith começou a falar... Ele postava-se meio de lado, como que conversando unicamente com seu intérprete e, este, com o megafone diante da boca, tornava as palavras que ouvia em inglês, compreensíveis aos seus iguais postados diante deles. Seus ouvidos captavam cada palavra que Pagan dizia, mas, todos os olhares permaneciam fixos naquele curioso estrangeiro...
Local onde Mr. Smith fez o discurso diante da multidão de funcionários...
O discurso: "Amigos, eu tenho certeza de que vocês todos estão todos preocupados com minhas últimas decisões, especialmente, pelo fato de eu ter ordenado que fizessem suas esposas e filhos retornar a seus lares nas cidades circunvizinhas... Eu não os culpo, acreditem: eu também estaria... Especialmente depois de termos passado estes últimos dias num clima tão gostoso, de reencontro, de restauração, de sentimento de reconstrução... É como se um lindo sonho de vocês todos estivesse sendo bruscamente interrompido... Mas, amigos, prestem muita atenção: não é nada disso...Na verdade é exatamente o oposto do que vocês estão pensando". E aqui, Mr. Smith fez pequena pausa, indicou a alguém próximo que estava precisando de um gole de água e, pode-se ver alguém lá na frente, junto a Mr. Smith e Pagan, sair apressado em direção ao interior da Usina. Sem esperar pela água, Mr. Smith aproximou uma das mãos meio fechadas da boca, pigarreou, pediu desculpas e continuou: "Rã..Rã, Desculpem... Vamos tentar continuar assim mesmo...". Excetuando-se o som do pigarro, o atento tradutor, Pagan, repetiu fielmente cada palavra de Mr. Smith ao megafone. Mr. Smith prosseguiu: "Pois bem, amigos, acalmem-se! Continuamos todos aqui, reunidos, com o mesmo propósito em nossas mentes e corações. E esse propósito agora está mais forte que nunca! Eu quero que saibam que, a princípio, eu tinha um cronograma. Um mapa, onde eu tinha detalhado todos os passos para, junto com vocês, usando o talento, o conhecimento e a habilidade de cada um, mestres que são em suas diferentes especialidades, recontruirmos tudo aqui em nosso Vale Encantado. Mas..." e antes que Mr. Smith continuasse, alguém se aproximou e elevou a ele um litro transparente, de boca larga, como os antigos litros de leite leite, cheio até a boca com água fresca da bica. Ele fez um sinal com a mão à multidão, como quem diz "Um momentinho". Serviu-se de uma bela talagada, deixando cair um pouco de água em seu peito. Em seguida ofereceu o mesmo litro ao Pagan, que não se fez de rogado. Colou os lábios no litro e bebeu, bebeu, bebeu... e bebeu! Mr. Smith fez uma careta e apontou para seu tradutor no alto daquela mesa, daquela plataforma improvisada sobre a qual ambos estavam e aquelas centenas de homens diante deles, já mais descontraídos com as primeiras palavras do discurso de Mr. Smith e com a sede do Pagan que parecia estar numa ressaca braba, abriram largos sorrisos. Mr. Smith pegou o megafone das mãos de Alberto Pagan e arriscou num portunhol dos mais sofríveis: "Pagan parece um borrachon, não?". Mais risadas...
Alguns homens riram do comentário de Mr. Smith que tratou de prosseguir com seu discurso. "Bem, mas, continuando... Eu tinha um cronograma segundo o qual teríamos todo nosso vale restaurado em 6 meses, com todos nós trabalhando num determinado ritmo. E isso incluía a limpeza de toda a área aqui entre estas montanhas, o corte de todo mato ao longo do rio e das ruas, a remoção de toda pedra e entulho que estivesse fora do lugar. Meu plano previa a restauração completa de todas as casas - da fundação ao telhado, passando pelo acabamento, a parte elétrica, hidráulica, a pintura...Meu projeto também vislumbrava novos: campo, vestiários, sede, pensões, área dos churrascos... Novos campos de malha e de bocha, escolinhas (do Balanço e a do Acampamento)...E, caros amigos, segundo meus planos, teríamos tudo isso concluído em 6 meses, com todos já morando aqui. Mas, depois do que vi a noite passada...Noite, aliás, em que não consegui pregar os olhos... Lembrando-me da alegria que observei no olhar de cada um de vocês, da emoção que tomou conta de cada homem, mulher, jovem, criança... Observando da janela de minha casa as fumaças das fogueiras subindo de todos os acampamentos que mandei montar para que vocês passassem esta noite juntos, eu me dei conta de uma coisa importante. Eu me dei conta que essa coisa mágica, poderosa que vocês sentem uns pelos outros e por cada centímetro deste lugar chama-se AMOR. E amor, amigos... Amor lindo assim não pode e nem deve esperar! Então, em vez de 6 meses (com a presença de suas famílias aqui), decidi que era hora de fazer vossas esposas e filhos voltarem para vossas residências atuais para que nós outros, os profissionais que aqui ficássemos estivéssemos 100% focados no trabalho de restauração. E assim, amigos, não teremos de esperar por longos 6 meses... Mas, apenas 1 mês!...SIM, UM MÊS APENAS...(e aqui Mr. Smith elevou a voz)...para que estejamos novamente todos reunidos numa grande e inesquecível festa e para, daqui, nunca mais sairmos!". Quando Mr. Smith pronunciou essa última palavra, todos os homens diante daquela plataforma improvisada, começaram a aplaudir, a assoviar a se abraçar! Todos, absolutamente todos, tinham os olhos marejados...
...Continua
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